Deitei e fiquei observando suas qualidades; tão metálico; tão brilhoso; tão evidente. Me questionei, porém, por qual motivo ele perdia um pouco disso tudo quando eu o usava. Por que é que ele só ficava majestoso quando eu o tirava do braço e o olhava de fora, como um terceiro observador?
Certo dia, eu, intrigado, fiz um teste: retirei o relógio do braço e o coloquei na mesa. Pensei: nossa! Que lindo! Imediatamente, coloquei-o no braço. Olhei com atenção o relógio. Posicionei o meu braço em vários ângulos. Busquei porque busquei aquela beleza de segundos atrás, mas não a encontrei.
Por que a graça se perdia de maneira tão trágica assim? Por quê?
Nesse exato instante, algo me levou à conclusão-teoria de que nós, imersos em uma dada realidade, não conseguimos enxergar com precisão a essência de nada daquilo que nos rodeia.
A solução seria nós nos elevarmos; teríamos que flutuar uns metros acima para, só então, extraídos do contexto, poder realmente enxergar. Ver com olhos abertos.
Pensei no quão bobas são algumas pessoas que se lamentam, por exemplo, por não terem dado a atenção que queriam a um ente querido que há pouco se foi. Lembrei também de lamentações corriqueiras do tipo: "Óh, poderia ter feito assim e assado"; "Óh, poderia ter amado mais".
Impossível ter agido diferente, concluí.
Impossível ter "amado mais", ter "sorrido mais", ter "chorado mais", pelo simples fato de que sempre interagimos. Estamos sempre inseridos em um contexto, em uma realidade. E, sendo assim, o brilho de tudo nunca é tão intenso.
Não podemos olhar o relógio na mesa e vesti-lo ao mesmo tempo. Ou você participa de uma peça e se acostuma com a personagem, ou você assiste à peça e acha a personagem magnífica.
Por conta disso, nunca conseguiremos amar de uma maneira surpreendente os elementos com os quais interagimos. Nunca conseguiremos dar valor máximo às coisas que possuímos.
Achei graça com o fato de que, sempre quando termino um conto qualquer, faço questão de analisá-lo imediatamente, publicado no blog. Leio-o como um visitante qualquer. Nessa segunda leitura, com olhos de terceiro, tudo me parece muito diferente daquilo que escrevi segundos atrás. E me soa muito melhor!